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Austeridade seletiva e ajuste fiscal

Generalizar a crítica às renúncias fiscais é um erro recorrente

Por Murillo de Aragão 30 Maio 2025, 06h00

O ministro da Fazenda, Fernando Had­dad, aproveitou o Dia da Indústria para reforçar o discurso do governo sobre o desafio fiscal brasileiro. Com razão, lembrou que o equilíbrio das contas públicas é uma tarefa coletiva e que o país convive com um déficit primário estrutural da ordem de 2% do PIB — problema crônico, que atravessa governos e ciclos econômicos. Também apontou o volume expressivo de renúncias fiscais: segundo ele, são mais de 800 bilhões de reais em isenções, subsídios e benefícios concedidos, por via legislativa ou istrativa, muitas vezes à revelia de critérios técnicos claros. Para o Congresso, o número de Haddad está superinflacionado. Os benefícios seriam da ordem de 540 bilhões.

O diagnóstico, embora pertinente, carece de completude e é impreciso. Não é de hoje que o Brasil convive com um sistema tributário complexo, ineficiente e, sobretudo, repleto de exceções. A crítica às desonerações e ao poder do lobby corporativo é válida. Contudo, ela é parcial e ignora um aspecto importante: muitos setores da economia brasileira simplesmente não são viáveis sem algum grau de proteção, de isenção ou de subsídio. A alta carga tributária, aliada a entraves logísticos, infraestrutura precária, insegurança jurídica e volatilidade regulatória, faz com que, sem incentivos, determinadas cadeias produtivas fechem as portas — do agronegócio à indústria de base, da tecnologia à cultura.

“Muitos setores da economia brasileira simplesmente não são viáveis sem algum grau de proteção”

Generalizar a crítica às renúncias fiscais sem contextualizar suas origens, seus impactos regionais e sua função enquanto política industrial é um erro recorrente das equipes econômicas, que sempre buscam resolver questões estruturais com o aumento puro e simples de arrecadação. Há benefícios que, sim, precisam ser revistos ou extintos. Mas há outros que cumprem um papel de equalização econômica, de incentivo à inovação ou de combate às desigualdades regionais. É simplista — e politicamente conveniente e rasteiro — pintar todo o sistema como um jogo de “vencedores escolhidos por lobby”.

Ao mesmo tempo, o discurso do governo e do próprio ministro silencia sobre dois temas igualmente estruturais e pouco enfrentados: o corte de despesas da máquina pública e o engessamento do Orçamento federal. Mais de 90% dos gastos públicos são obrigatórios ou vinculados — incluindo folha de pagamento, Previdência, benefícios assistenciais e transferências constitucionais. O espaço de manobra é mínimo, e qualquer tentativa de reforma ou de contenção invariavelmente esbarra em resistência política, corporativa e judicial. Tampouco existe esforço do governo para reduzir, gradualmente, os benefícios e isenções que considera prejudiciais.

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A máquina pública brasileira, com seu corporativismo enraizado, consome uma fatia desproporcional dos recursos nacionais. Benefícios acumulados ao longo das décadas, especialmente em segmentos do funcionalismo de elite, seguem intocados. Os debates sobre racionalização istrativa, fim de penduricalhos salariais, revisão de carreiras e controle de despesas de custeio continuam marginais — quando não são varridos para debaixo do tapete. Sem enfrentar a despesa pública engessada, sem rever o pacto federativo, sem uma reengenharia do papel do Estado e uma melhoria expressiva do ambiente de negócios e investimentos, o Brasil continuará preso a um círculo vicioso de déficits, juros elevados e baixo crescimento.

Publicado em VEJA de 30 de maio de 2025, edição nº 2946

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